Sou estudante de Filosofia da Universidade Federal de
Pelotas/RS e tenho vulnerabilidade socioeconômica, o que me permite viver na
Casa do Estudante e ter alimentação gratuita no RU. Resumindo: faço parte de um
grupo de estudantes de graduação que não tem fonte de renda e nem ajuda e
familiares.
Legal, mas o que alguém que vive nessas condições tem a
acrescentar sobre viagens?
Bem, a verdade é que sei muito bem como ser vagabunda
profissional, ou, mais precisamente, vagabunda acadêmica ou graduando. E
resolvi, inspirada pelo blog Vagabundo Profissional (http://vagabundoprofissional.com/) compartilhar um pouco da minha experiência em viajar às custas da universidade.
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Eu, sempre na estrada, com camisa da universidade pra facilitar identificação na carona. |
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Companheiro e vizinho Mário Jr, também devidamente identificado com camisa da UFPel. |
Vejo muitas pessoas ao meu redor, dentro da universidade,
reclamando que não podem viajar, seja porque não têm grana, seja por falta de
tempo, seja porque não podem faltar na faculdade. A verdade é que, isso não
pode ser usado como argumento quando você tem real envolvimento com a vida
acadêmica e, especialmente, com a militância estudantil. E quando eu falo em
militância não me refiro a envolvimento com partidos políticos, coletivos, DCEs
ou centros acadêmicos. Pois você não precisa fazer parte destes grupos pra
observar as condições educacionais, especialmente do ensino público, e lutar
por melhorias.
Ok. Mas, outra vez: o que isso tem a ver com viagens?
Nenhuma dessas desculpas supracitadas podem ser usadas como
argumento para não viajar durante a vida acadêmica. Não é todo mundo que tem
grana pra férias. Mas qualquer um, com devido planejamento e comprometimento,
consegue viajar na faixa e de quebra conviver durante alguns dias com pessoas
de diversos lugares e hábitos diferentes, além de ter experiências acadêmicas
que acrescentam o currículo, geram certificados e horas de atividades
extracurriculares.
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Carona com O Bailarino |
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Carona com Jerry Adriani (!!) |
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Chegada em Floripa, recepcionados pelos residentes da CEU UFSC, no ERECE Sul 2012 |
Em geral, todos os cursos – ou ao menos os mais tradicionais
– possuem organizações estudantis a nível nacional, que constroem encontros e
congressos de estudantes. Por exemplo, a Filosofia tem a ABEF (Associação
Brasileira dos Estudantes de Filosofia), que organiza anualmente dois eventos:
ENEFIL (Encontro Nacional dos Estudantes de Filosofia) e o COBREFIL (Congresso
Brasileiro dos Estudantes de Filosofia), sendo este último de caráter
organizativo e político. Mas em ambos, estudantes de Filosofia de todo o país
se reúnem pra apresentar trabalhos, assistir palestras organizadas pelos
próprios estudantes, com assuntos também escolhidos por nós, e, por vezes,
escolhemos até os palestrantes.
Fora os encontros e congressos nacionais de cursos, ainda
existem os encontros regionais.
No meu caso, que sou residente de Casa de Estudante, ainda
conto com encontros nacionais e regionais de Casas de Estudantes, e mais os
pré-encontros de Casas, tanto nacional como regional, com caráter organizativo
dos encontros.
Mas de que adianta ter tantos eventos que acontecendo
anualmente em cidades diferentes se não tenho dinheiro pra viajar?
Bom, essa é a parte importante.
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Não se pode esquecer as Culturais diárias que os encontros promovem pra rolar o intercâmbio cultural |
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Alojamento com teto é luxo pra quem costuma acampar em posto de gasolina. Fotos do EREFIL Sul 2011 - UFSC |
As universidades investem em estudantes que produzem e
participam de eventos apresentando trabalhos e divulgando, assim, o nome da
instituição. Em geral, quando se apresenta trabalhos ou se ministra atividades
ou oficinas nestes eventos, ganha-se um certificado de apresentação de
trabalho, além do de participação, e por vezes, conta-se com publicações de
artigos. E isso é muito bem visto pelas universidades. Desta forma, fica fácil
conseguir pela tua própria instituição de ensino, financiamento de passagens,
diárias e até inscrição nos eventos. Tudo pra garantir que o estudante, ao
divulgar seu trabalho, divulgue também, o nome da instituição.
E se um grupo grande de estudantes vai apresentar trabalho
no mesmo evento, rola até de conseguir um ônibus por conta da universidade pra
levar estes e outros estudantes interessados em participar do evento. Fora os
eventos organizados pelo Movimento Estudantil, existem outros eventos
específicos organizados pelas próprias universidades, não apenas para seus
estudantes, mas aceitam trabalhos e inscrições de estudantes de outras
instituições. Geralmente as universidades públicas possuem verba pra viagens
para estudantes em participação de eventos. Busque informação, produza
conhecimento e corra atrás. Às vezes até rola de pegar carona com outras
universidades.
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Cumprindo a proposta, apresentações de trabalhos e troca de experiências acadêmicas são fundamentais |
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Aproveitando o dia livre pra conhecer as comunidades. Fotos do ENEFIL 2012 UFMA |
E se você for morador de Casa de Estudante de alguma
universidade, daí você tirou a sorte grande, meu amigo! Sim, ser pobre tinha
que ter alguma vantagem...
Então, meu caro companheiro e vizinho residente de CEU, você
precisa conhecer os seus direitos. Assistência estudantil não é só casa e
comida (e por vezes, roupa lavada). O Decreto Nº 7.234, de 19 de julho de 2010,
que dispõe sobre o PNAES – Programa Nacional de Assistência Estudantil, se
apresenta com objetivos como “minimizar os efeitos das desigualdades sociais e
regionais na permanência e conclusão da educação superior” e também “contribuir
para a promoção da inclusão social pela educação.” Ou seja, meu companheiro de
assistência estudantil, você pode requisitar a verba do PNAES da sua IFES pra
financiar aquele trabalho que tu queria apresentar lá naquele congresso no
Oiapoque ou no Chuí. Claro que vai depender se seus argumentos forem
convincentes, o trabalho digno e ainda houver sobra dessa grana do PNAES na sua
universidade.
E além disso, se você está de férias, mas não tem dinheiro
pra viajar e nem se hospedar por aí, muitos eventos estudantis acontecem em feriados
prolongados e nas férias (e se você participa de algum durante o período de
aulas, com certificado na mão tu pode solicitar abono ou justificar as faltas).
Além de tentar carona, seja na estrada (recomendo sempre!), seja com ônibus de
universidades vizinhas, sempre rola a hospedagem solidária nas Casas de Estudantes.
Mas se liguem! Não é pra qualquer um! Pode até ser que você chegue do nada numa
CEU e peça hospedagem por uns dias e consiga. Mas é muito mais fácil se você,
como residente de CEU, participa do
Movimento de Casas de Estudantes, e luta por melhores condições de moradia e de
assistência estudantil. A militância te permite conhecer companheiros de Casas
de vários lugares do país, o que pode te ajudar seja pra uma hospedagem durante
um congresso, durante um período de provas, ou mesmo nas férias.
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Intercâmbio musical no alojamento do ENEFIL 2011 UFF Niterói |
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Dia livre com rolê pela orla de Niterói, 2011 |
Normalmente os eventos possuem dias livres, que te permitem
passear e conhecer a cidade onde os eventos acontecem. Hora de fazer turismo! E
se você tiver espírito explorador, sairá das rotas tradicionais de turismo pra
se arriscar conhecendo coisas novas e diferentes.
Pra vocês terem ideia, em três anos de faculdade, viajei na
faixa, com tudo pago pela universidade para São Luis do Maranhão, São Paulo,
Florianópolis, Rio de Janeiro, Brasília, Niterói, Rondonópolis, Porto Alegre
(essas são as que me recordo). E ainda este ano estou pleiteando mais uma
viagem para São Paulo, Salvador, Palotina e Cuiabá. Tudo isso apresentando
trabalho de pesquisa. E pras férias, estou vendo carona com ônibus de estudantes
pra Fortaleza, e com caminhoneiros – sempre parceiros dos estudantes – para Argentina
e Uruguai.
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Lutando por mais moradias estudantis nas universidades - ENCE 2013 UFRJ |
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Ilha de Paquetá, RJ |
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Oficina de Siriri, com o pessoal da UFMT, durante o ENCE 2013 |
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Parque Nacional da Floresta da Tijuca |
Portanto meu caro amigo, sua produção acadêmica pode te
ajudar muito a viajar e conhecer lugares e pessoas, mesmo sem nenhum tostão no
bolso. Ou melhor ainda, com tudo financiado pela universidade. Assim, você não
precisa esperar se formar, entrar no mercado de trabalho e juntar dinheiro pra
poder viajar. As oportunidades estão aí.
Procurem seus colegas de cursos pelo país, e as associações
de estudantes do teu curso. Fique sempre ligado nos eventos acadêmicos
espalhados pelo Brasil – e pelo exterior também. Se informe na sua universidade
sobre auxílio viagem. E se você é atendido pela assistência estudantil, se informe
sobre o PNAES (decreto disponível no site do MEC http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=607&id=12302&option=com_content&view=article).
Façam valer seus direitos e pé na estrada, não só pra
passear, mas pra mostrar seu trabalho e trocar conhecimento. Isso também é
formação acadêmica!
E não se esqueça de sempre estar ligado nas oportunidades de mobilidade acadêmica e de intercâmbios!
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Aldeia Maracanã, 2013 |
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Almoçando na Universidade Indígena Aldeia Maracanã |
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Aldeia Maracanã, Rio. |
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Pôr do Sol em Pelotas durante o Pré-ERECE Sul 2013 |
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Pré-ENCE 2013, UFMT Rondonópolis |
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Melhor companheira de viagens de todos os tempos, devorando os cocos de Rondonópolis/MT |
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Pré-ENCE 2013, UFMT |
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Feira notura em Rondonópolis, devido ao calor que acontece durante o dia. |
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Aldeia Maracanã, 2013 |
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Aldeia Maracanã, 2013 |
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Povo do Matogrosso nos presenteando com uma bela peixada |